Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, nos deixamos inspirar por três personagens reais que tiveram suas trajetórias retratadas em produções de gêneros diferentes, todas disponíveis em streaming.
A jovem enxadrista Phiona Mutesi, hoje com 26 anos, ganhou uma cinebiografia em Rainha de Katwe, produção da Disney para toda a família. A ex-juíza Ruth Bader Ginsburg (1933-2020) é tema do documentário indicado ao Oscar A Juíza, e a empresária Sarah Breedlove (1867-1919) tem sua saga narrada na minissérie A Vida e a História de Madam C.J. Walker.
Elas viveram em tempos diferentes e são exemplos perenes de perseverança, determinação e coragem, adjetivos que certamente nos ajudam a atravessar momentos difíceis e desafiadores como a pandemia de Covid-19. Com Phiona, Ruth e Sarah, mantemos a esperança.
Drama Biografia

Rainha do Katwe/Queen of Katwe
Por FÁTIMA GIGLIOTTI
Pequeno subúrbio de Kampala, capital da Uganda, Katwe ganhou destaque no mapa-múndi cinematográfico com as vitórias seguidas da precoce rainha do xadrez nacional, Phiona Mutesi. Sua história extraordinária ganhou as páginas da ESPM Magazine, no artigo do jornalista Tim Crothers, autor também da biografia da campeã, que inspiraram Rainha do Katwe, produção da Disney, um tanto distante dos paradigmas do estúdio, em parceria com a ESPM.
Nas mãos da diretora indiana Mira Nair (Feira das Vaidades), a façanha da jovem esportista transforma-se numa história de superação que não evita a realidade nem o realismo. Também não perde de vista o apuro estético característico do estilo da cineasta, afeita ao colorido, à alegria e à miséria a céu aberto de certas narrativas de sua terra natal. Para tanto, ela conta com o talento de David Oyelowo (O Céu da Meia-Noite) e Lupita Nyong’o (Nós), e o carisma autêntico do elenco de jovens atores ugandenses e sul-africanos, inclusive mirins, a maioria estreando no cinema, como a própria Madina Nalwanga no desafiador papel de Phiona.
Viúva, Nakku Harriet (Lupita Nyong’o) mal consegue sustentar seus quatro filhos com a venda de milho nas feiras e no trânsito caótico de Katwe, mas luta por eles com todas as forças. Na missão local, o desempregado engenheiro Robert Katende (David Oyelowo) trabalha meio período como o amoroso e dedicado professor de xadrez das crianças do bairro, a quem serve mingau, a única refeição que muitas delas terão no dia. Seguindo seu irmão Brian (Martin Kabanza) até uma das aulas, Phiona é apresentada ao tabuleiro, e logo revela seu talento genuíno no esporte.
É impossível não se comover com os assombrosos revezes que Phiona e sua família enfrentam, expostas a uma pobreza atroz, face à única arma que a jovem garota prodígio e seu treinador possuem para seguir adiante: uma força de vontade descomunal, que os diálogos sensíveis se encarregam de transformar numa dolorida metáfora da sobrevivência. No filme de Mira Nair, além de Phiona com sua determinação juvenil, há outras rainhas do Katwe - a mãe guerreira, a irmã mais velha que não escapa da prostituição, a compreensiva mulher do treinador que aceita alfabetizar o time nas horas vagas. Um testemunho precioso da mestria e da coragem do feminino na condução da vida.
Para quem conseguiu passar imune pelas aventuras e desventuras da Rainha do Katwe, os créditos finais reservam uma surpresa para nos lembrar, mais uma vez, que a jornada da campeã de xadrez Phiona Mutesi não é ficção.
Trailer
Ficha Técnica
TÃtulo: Rainha do Katwe/Queen of Katwe
Direção: Mira Nair
Duração: 124 minutos
PaÃs de Produção/Ano: EUA, 2016
Elenco: Madina Nalwanga, David Oyelowo, Lupita Nyongo, Martin Kabanza, Ronald Ssemaganda, Ethan Nazario Lubega
Distribuição: Disney+
Documentário

A JuÃza/RBG
Por FÁTIMA GIGLIOTTI
As letras RBG, do título original, são as iniciais de Ruth Bader Ginsburg (1933-2020), a segunda mulher a integrar o seleto e vitalício grupo de magistrados membros da Suprema Corte dos Estados Unidos, equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil. Nomeada em 1993 pelo então presidente Bill Clinton, após uma trajetória notável como advogada e professora dedicada principalmente à defesa e normatização da igualdade de direitos entre homens e mulheres no país, Ruth foi “protagonista” de duas produções em 2018, ano que completou 25 anos de exercício da justiça na Suprema Corte americana.
A primeira produção a ser lançada no Brasil foi Suprema, cinebiografia estrelada por Felicity Jones (O Céu da Meia-Noite). A segunda é A Juíza, documentário dirigido por Julie Cohen e Betsy West, respectivamente experientes diretora e produtora de filmes e séries documentais com implicações políticas. Com coprodução da CNN Films, a produção foi indicada a dois Oscar: documentário de longa-metragem e canção - “I’ll Fight”, escrita por Diane Warren na voz de Jennifer Hudson (Dreamgirls – Em Busca de um Sonho).
Sem deixar de ser convencionais ao combinar relatos, entrevistas e depoimentos - da própria Ruth, de familiares, colegas, biógrafas, oponentes, críticos, e até do ex-presidente Clinton -, as diretoras se utilizam de um amplo conjunto de informações e registros para imprimir ritmo ágil, consistência e relevância no retrato da vida e da carreira da jurista. Ela continuou a atuar na Suprema Corte, em posição cada vez mais liberal, até sua morte, aos 87 anos, em 18 de setembro de 2020.
Em 2013, com o voto discordante da decisão do Supremo que derrogava artigo de lei que proibia a discriminação racial nas eleições, foi alçada à condição de ídolo pop e celebridade nacional com o blog “Notorius R.B.G.”, escrito em sua homenagem por uma estudante de direito (ainda no ar). A Juíza tem ainda o mérito de evidenciar que todos podem dar sua contribuição na construção de um mundo mais justo e melhor.
Trailer
Ficha Técnica
TÃtulo: A JuÃza/RBG
Direção: Julie Cohen, Betsy West
Duração: 98 minutos
PaÃs de Produção/Ano: EUA, 2018
Elenco: Ruth Bader Ginsburg, Arthur R. Miller, Bill Clinton, Clara Spera, James Steven Ginsburg, Jane C. Ginsburg, Mary Hartnett, Wendy Williams
Distribuição: Flow Distribuidora
Drama Biografia

A Vida e a História de Madam C.J. Walker/Self Made: Inspired by the Life of Madam C.J. Walker
Por SUZANA UCHÔA ITIBERÊ
Em 1919, Madam C. J. Walker entrou para o Guinnes, o livro dos recordes, como a primeira mulher a ganhar US$ 1 milhão por conta própria. Nascida livre em 1867, mas filha de escravos e órfã aos 7 anos, Sarah Breedlove não estudou e sobrevivia como lavadeira em St. Louis, no Missouri do início do século 20. Como chegou de um extremo ao outro é o que conta em quatro episódios a minissérie da Netflix A Vida e a História de Madam C.J. Walker.
Vencedora do Oscar 2012 de atriz coadjuvante por Histórias Cruzadas, Octavia Spencer (A Cabana) interpreta a protagonista com uma energia pulsante. A trama é inspirada na biografia On Her Own Ground: The Life and Times of Madam C.J. Walker, escrita pela tataraneta da empresária, a jornalista A’Lelia Bundles. O filme não conta, mas Sarah casou-se aos 14 anos para escapar dos abusos de um cunhado. Teve a filha Lelia (Tiffany Haddish, Rainhas do Crime) aos 18 e ficou viúva aos 20. Tinha separado do segundo marido quando viu seu ralo cabelo crescer ao usar o tônico capilar criado por Annie Malone, no filme chamada Addie (Carmen Ejogo, Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald).
Não fica claro se Sarah roubou ou melhorou a fórmula para abrir sua própria empresa de cosméticos, mas a rivalidade entre as duas mulheres é o motor da narrativa. O casamento com Charles Joseph Walker (Blair Underwood, da série Em Terapia), de onde vem sua alcunha profissional, também ajuda a traçar o perfil dessa guerreira que colocou o trabalho acima de tudo. Dona de um aguçado tino comercial e publicitário, ela desenvolveu uma linha de produtos voltada para a mulher negra. Não foram poucos os desafios para empreender em um universo dominado por homens brancos, e em uma América recém-saída do período escravagista.
A Vida e a História de Madam C. J. Walker mostra que nem tudo nessa notável trajetória parece ter sido ético, assim como nem todo o dinheiro que conquistou lhe garantiu felicidade. Seu legado – e aqui o enredo deixa uma lacuna – foi além de desbravar e fazer fortuna no mundo dos negócios. Madam C.J. Walker abriu espaço para a comunidade atuar no mundo corporativo, também contratou Vertner Tandy, primeiro arquiteto negro registrado em Nova York, para erguer sua mansão, a Villa Lewaro, e foi filantropa generosa a ativista atuante. Uma peça rara.
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Ficha Técnica
TÃtulo: A Vida e a História de Madam C.J. Walker/Self Made: Inspired by the Life of Madam C.J. Walker
Direção: DeMane Davis, Kasi Lemmons
Duração: 191 minutos
PaÃs de Produção/Ano: EUA, 2020
Elenco: Octavia Spencer, Tiffany Haddish, Carmen Ejogo, Blair Underwood, Kevin Carroll, Garrett Morris
Distribuição: Netflix