Não deve ser nada fácil realizar um novo filme depois de estrear com uma obra-prima. O dramaturgo e cineasta francês Florian Zeller ganhou o Oscar de roteiro adaptado por Meu Pai (2020), que tornou Anthony Hopkins, aos 83 anos, o ator mais velho a receber a estatueta dourada. Essa obra irretocável é agora seguida por Um Filho, novamente uma transposição de peça de sua autoria que, com A Mãe, formou nos palcos a trilogia da família.
Indicado ao Oscar por Os Miseráveis (2012), Hugh Jackman entrega outra potente atuação dramática, que lhe valeu indicação ao Globo de Ouro. Ele é Peter, advogado renomado com um pé na política, que vive a paternidade pela segunda vez com a nova parceira, Beth (Vanessa Kirby). Seu primogênito, Nicholas (Zen McGrath), tem 17 anos, e é para falar sobre ele que Kate (Laura Dern), a ex-mulher, bate à sua porta. Ela acaba de descobrir que há quase um mês o filho não vai à escola.
“Eu não sei o que está acontecendo comigo”, Nicholas diz ao ser confrontado pelo pai. Um Filho é sobre saúde mental, divórcio, paternidade e uma realidade dura de admitir: nem sempre o amor é o suficiente. Ao retratar o mal de Alzheimer em Meu Pai, o diretor inseriu o espectador no labirinto imagético da mente do paciente. Agora observa à distância, com um olhar clínico sobre o passado e o presente dessa família que se desintegrou, e abriu um rombo emocional em uma criança.
Nicholas vai morar com Peter e a dinâmica do novo arranjo familiar serve de fio narrativo. Causa estranheza que o roteiro – nova parceria entre Zeller e Christopher Hampton – praticamente ignore a presença do bebê e não explore os sentimentos do mais velho pelo caçula. Demora em demasia para que a palavra depressão seja pronunciada, em um aflitivo processo de negação de adultos sufocados pela culpa.
Há sinais da relação conturbada entre Peter e o próprio pai. A rusga se consolida em um rigoroso diálogo que traz Anthony Hopkins, em participação especial, como o patriarca cruel e pragmático, que diz a Peter tudo o que ele não quer ouvir. Hugh Jackman contou em entrevistas que a história o fez refletir sobre danos da infância que se repetem. "O trauma é como um incêndio que atravessa gerações e gerações, a menos que se tenha a coragem de realmente parar e compreender o que aconteceu.”
Outra sequência arrasadora é a conversa do psiquiatra com Nicholas e os pais, que coloca em encruzilhada o destino do jovem e põe em xeque o poder do amor. Um Filho traz para o debate temas relevantes, é melancólico, duro mesmo. Mas não chega aonde poderia a níveis dramáticos porque falta intensidade ao jovem Zen McGrath. Basta lembrar de Timothée Chalamet em Querido Menino (2018), também sobre divórcio e paternidade, mas com o vício em drogas no centro. Aquele sim tinha um olhar de desemparo que doía na alma.
Trailer
Ficha Técnica
TÃtulo: Um Filho / The Son
Direção: Florian Zeller
Duração: 123 minutos
PaÃs de Produção/Ano: Reino Unido / França, 2022
Elenco: Hugh Jackman, Zen McGrath, Laura Dern, Anthony Hopkins, Vanessa Kirby
Distribuição: Diamond Films