Os Olhos de Cabul ganha novos significados com a tomada de poder do Talibã no Afeganistão nesse tenebroso agosto de 2021, passados 20 anos da expulsão do grupo extremista de Cabul pelas forças dos Estados Unidos, em 2001. Imagens das mulheres em outdoors e vitrines começam a ser pintadas e, por mais que o porta-voz do Talibã tenha se comprometido a honrar os direitos das mulheres - desde que dentro das normas da lei islâmica -, notícias de invasões em casas e expulsão de maridos começam a se espalhar. Muito triste, o que torna ainda mais pungente o trabalho das diretoras Zabou Breitman e Eléa Gobbé-Mévellec, que adaptam o livro As Andorinhas de Cabul, de Yasmina Khadra.
A animação francesa teve estreia mundial na Mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes 2019, e saiu premiada do Festival de Cinema de Animação de Annecy. Só para o público adulto, atenção, porque o tema aqui é o suplício de se viver no Afeganistão sob o jugo do Talibã. O regime fundamentalista islâmico dominou o país entre 1995 e 2001, e agora o respiro de duas décadas chegou ao fim. A obrigatoriedade de barba em homens é citada na história, mas a opressão pra valer é contra as mulheres. Proibidas de frequentar escolas e trabalhar, elas só podiam sair de casa com a burca que cobre todo o corpo, apenas com uma rede na altura dos olhos para enxergar. Rádio, TV e cinema também foram banidos. Vamos ver como será agora.
Em Os Olhos de Cabul, a capital ganha cores sóbrias em desenhos feitos à mão como pintura em aquarela. É lírico e realista, em especial no retrato das ruínas em que se encontrava a cidade após a guerra civil com a então União Soviética. A trama situa-se no verão de 1998 e começa com a execução por apedrejamento de uma mulher condenada por fornicar. É ali que conhecemos Mohsen, jovem historiador impedido de lecionar depois da destruição da universidade local. Sua amada é Zunaira, uma artista plástica moderna e cheia de vida, que não perde a esperança em um futuro de liberdade. Perto da casa deles vive Atiq e Mussarat. Ele é carcereiro da prisão feminina, ela é a esposa mais velha, submissa e deprimida por um câncer terminal.
A partir de um incidente, as cineastas costuram a vida desses quatro personagens à luz do radicalismo. Os Olhos de Cabul não se apega à denúncia. As monstruosidades estão à mostra, mas há sutileza nessa versão animada. A densidade maior está nos protagonistas, todos com sua carga de sinuosidade. As reações de cada um deles ao horror são banhadas de humanidade, e como o ser humano é imperfeito, algumas têm consequências drásticas. O final é arrebatador.
Trailer
Ficha Técnica
TÃtulo: Os Olhos de Cabul/Les Hirondelles de Kaboul
Direção: Zabou Breitman, Eléa Gobbé-Mévellec
Duração: 81 minutos
PaÃs de Produção/Ano: França/Mônaco/Luxemburgo/SuÃça, 2019
Elenco: Simon Abkarian, Zita Hanrot, Swann Arlaud, Hiam Abbass
Distribuição: Vitrine Filmes