Argentina, 1985

“Nunca mais”, disse o promotor Julio César Strassera no célebre discurso em que pediu a condenação de nove comandantes militares acusados de violação dos direitos humanos durante a ditadura argentina, entre 1976 e 1983. Em Argentina, 1985, a frase é dita por Ricardo Darín, astro máximo de seu país, que o faz com a mesma convicção que transformou o advogado em herói nacional. Premiado nos festivais de Veneza e San Sebastián, o filme chega ao Prime Video como representante da Argentina no Oscar 2023.

Depois da histórica condenação de nazistas na corte de Nuremberg, o chamado Julgamento das Juntas foi o maior em casos de crimes cometidos por um regime. Darín não só repete a parceria com Santiago Mitre, seu diretor em A Cordilheira (2011), como atua como produtor. Apesar da gravidade do tema, é uma obra acessível e permeada de humor. Muito porque o enredo foca a dinâmica de Strassera com seu assistente, Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani, O Anjo), e com o time de jovens que, em cinco meses, reuniu 4 mil páginas, 709 casos e mais de 800 testemunhos apresentados como provas.

As constantes ameaças de morte aos advogados levantam a tensão, assim como o fato de o presidente democrático Raúl Alfonsin manter em cargos de confiança figuras do antigo governo. Se em casa Strassera tem apoio da mulher e do casal de filhos – destaque para a colaboração com o adolescente –, Ocampo enfrenta o desprezo da mãe e da família ligada aos militares. A comoção bate forte, porém, quando ela lhe telefona, espantada com o relato da mulher que conta no tribunal ter sido torturada grávida de seis meses, e mais tarde obrigada a dar à luz em um carro, vendada e algemada com as mãos nas costas.

A reprodução de testemunhos é avassaladora. O diretor fez um extenso trabalho de pesquisa para a confecção do roteiro, com um conteúdo documentado que não poderia surtir outro efeito a não ser engajar emocionalmente todo o elenco. A narrativa é clássica, em ordem cronológica. Argentina, 1985 dispensa firulas estilísticas. Sua potência está na realidade aterradora e já longínqua, que demanda ser resgatada de tempos em tempos para que as novas gerações tenham a mesma frase eternizada por Strassera sempre em mente: “nunca mais”.

Ficha Técnica

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