domingo, 01 de junho de 2025
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São Paulo, Sociedade Anônima


São Paulo, Sociedade Anônima
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Revisitar a obra-prima de Luiz Sérgio Person (1936-1976), marco da cinematografia paulista e brasileira, é se encantar duplamente. Primeiro, com o domínio artístico e a concepção antropofágica do cineasta sobre o homem moderno e urbano. Depois, com a beleza das imagens da São Paulo de 1964 - em registro tanto ficcional como documental, um memorial exuberante - e a denúncia, hoje profética, da matriz desagregadora, pessoal e coletivamente, da submissão humana ao capital, ao consumo e à indústria.

Da primeira à última sequência, em deslumbrante preto e branco e com ecos do neorrealismo, os altos prédios imponentes e as multidões de São Paulo, onipresentes, são espelho da opressão. A parceria entre Person, o diretor de fotografia argentino Ricardo Aronovich (A Família), com suas angulações e planos labirínticos e improváveis, o compositor Cláudio Petráglia (A Moreninha) e o elenco irretocável fizeram jus ao roteiro já brilhante por si só, escrito pelo cineasta. São Paulo, Sociedade Anônima - ou São Paulo S/A - é magistral.

São Paulo, Sociedade Anônima

Lançado em 1965, foi a estreia de Person na direção, e de Walmor Chagas (1930-2013) no cinema. Ele interpreta Carlos, protótipo do homem comum em trajetória de ‘se fazer’ na vida. Em cinco anos, de 1957 a 1961, Carlos se envolve com três mulheres e um empresário italiano com bom faro tanto para os negócios na promissora indústria automobilística, cortesia do “milagre brasileiro” do presidente Juscelino Kubitschek, como para as falcatruas financeiras e trabalhistas.

Person embaralha a cronologia e as emoções de Carlos. Ele “pensava que gostava de Ana” (Darlene Glória, Toda Nudez Será Castigada), pin-up sedutora e libertina, desgostosa com a obrigação de visitar a mãe doente no interior. Mas não deixava de desfrutar dos encontros com Hilda (Ana Esmeralda), mulher culta e despojada. Quando decidiu casar-se com a geniosa Luciana (Eva Wilma, Feliz Ano Velho), sua colega do curso de inglês, parece ter sido mais por impulso do que por amor.

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No trabalho, como o braço direito de Arturo (Otelo Zeloni, 1921-1973, Papai Trapalhão) na fábrica de engrenagens vendidas para as montadoras multinacionais, Carlos ganha acima da média. Mas não demonstra ambição profissional nem perde de vista a postura antiética do patrão, pessoal e corporativa. Ao saber da proposta secreta de Ana a Arturo para promovê-lo a sócio, e da decisão trágica de Hilda após a precoce viuvez, Carlos surta. Abandona Ana e o filho, o trabalho, rouba um carro e foge, a toda velocidade.

Apenas para voltar a São Paulo, no dia seguinte, inadvertidamente, na boleia de um caminhão, refém do moto-contínuo existencial do sonho feliz da metrópole. Carlos é um anti-herói, indelicado, espectador da sua própria vida. Recusa o padrão social do êxito, mas não o substitui por outro. Haverá outro? No documentário Person (disponível em streaming) de 2007, dirigido pela filha do cineasta, Marina Person, o ator Paulo José, que trabalhou com o cineasta em Cassy Jones, o Magnífico Sedutor (1972), afirma que “Person tinha uma trajetória que se previa extraordinária, seria das mais importantes do cinema brasileiro... porque ele sabia o que era escrever com a câmera”. São Paulo S/A é prova inegável da promessa, interrompida pela morte precoce do cineasta, aos 39 anos, em um acidente automobilístico.




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Ficha Técnica

Título: São Paulo, Sociedade Anônima
Direção: Luiz Sérgio Person
Duração: 107 minutos

País de Produção/Ano: Brasil, 1965
Elenco: Walmor Chagas, Eva Wilma, Otelo Zeloni, Darlene Glória, Ana Esmeralda
Distribuição: Columbia Pictures

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Fátima Gigliotti

Fátima Gigliotti

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Cinéfila incorrigível, jornalista, editora, professora (não muito), crítica (chatinha) de cinema e audiovisual. Trabalhou no jornal A Folha de São Paulo, na coleção Cinemateca Veja, nas revistas TVA, Ver Vídeo, Set, Querida e Preview.