Simpatia pelo Diabo

Simpatia pelo Diabo é o nome do romance autobiográfico de Paul Marchand, o correspondente de guerra que se tornou escritor, não sem antes ser ele mesmo vítima da violência no front. Mas a razão pela qual suas memórias na Guerra da Bósnia inspiraram a estreia do diretor canadense Guillaume de Fontenay é o modus operandi de Marchand. Elétrico, irreverente, impetuoso e corajoso, ele era uma figura ímpar, que agregava e repelia com a mesma intensidade.

Essa personalidade pulsante na busca pela notícia é o que move Simpatia pelo Diabo. Entrou há pouco no streaming o indicado ao Oscar de filme internacional Quo vadis, Aida?, filme excelente sobre o massacre de Srebrenica, executado no mesmo conflito e considerado o maior genocídio do pós-Segunda Guerra. O cenário aqui é Sarajevo, cercada pelos sérvios em 1992. Mais de 400 mil habitantes ficaram reféns, sob os olhares do mundo e a reação inépta das forças da ONU. Marchand (Niels Schneider, Um Amor Impossível) e o fotógrafo Vincent (Vincent Rottiers, Através do Fogo) estão ali desde o início do conflito.

Contar os mortos no necrotério é rotina diária, para ver se bate com os números oficiais. Marchand não tira o charuto da boca nem na hora de ajudar no salvamento das vítimas de um tiroteio. Ele se arrisca pelo beco dos atiradores de elite, distribui pizzas para os guardas liberarem sua passagem por territórios bloqueados, joga pôquer com colegas jornalistas nos momentos de calmaria e ainda conquista Boba (Ella Rumpf), a tradutora sérvia que o ajuda a transitar e se comunicar pela cidade. Provocador e idealista, também se indispõe com a mídia sensacionalista.

O diretor é mero observador desse tipo incansável. É verdade que Simpatia pelo Diabo não se aprofunda no personagem. Nada se sabe de sua vida pessoal, de sua família, de seus desejos e planos. Claro que chega um momento em que Marchand sucumbe psicologicamente ao horror, mas a turbulência emocional é explorada superficialmente. A força da narrativa está no exercício do jornalismo “raíz”: a apuração precisa dos fatos, a cobertura independente, ética e isenta. O jornalismo que Marchand realizava está em acelerada extinção, e já fazendo muita falta.

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