Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto

Não é fácil traduzir a complexidade e o sucesso de Rogéria, a travesti performer que realizou a façanha de conquistar, com raríssimas exceções, o coração dos brasileiros. Afinal, a sua carreira artística deslanchou ainda sob o conservador manto da ditadura no País, e se solidificou em meio ao preconceito latente da nossa sociedade. Mesmo assim, ela não só ganhou reconhecimento internacional, como foi vedete de show e atriz de novela da TV Globo – nos anos 1990.

Tudo isso é uma pequena parcela da admirável trajetória de Rogéria, contidas no documentário Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto, de Pedro Gui. O diretor começou a rodar as entrevistas com Rogéria em 2016, e foi surpreendido com a morte dela em 2017. Redesenhou o projeto, que ganhou ares de docudrama com indispensáveis encenações, status de filme-homenagem, mas é sobretudo um precioso e necessário registro de um(a) grande artista de fibra e talento inquestionáveis.

Estão na tela o menino Astolfo Barroso Pinto, nascido em Cantagalo, no Rio, em 1943, e a lady carinhosamente reconhecida nas ruas durante as entrevistas para o filme. Fala-se do maquiador Astolfo, da TV Rio, e da estrela, atriz e performer admirada. Os quatro irmãos, colegas de vida e de cena como Betty Faria, Jô Soares, Rita Cadillac e Nanny People, diretores que trabalharam com ela nos palcos e na televisão, como Bibi Ferreira e Aguinaldo Silva, apresentam seus relatos divertidos, emocionados, com açúcar e afeto. Quando é a própria Rogéria quem fala, personalíssima como sempre, tudo faz ainda mais sentido.

Se a produção é simples, às vezes simplória, a qualidade do conteúdo empata e ganha o jogo. O diretor Pedro Gui leva o filme a tocar, ainda que de leve, em questões essenciais como tolerância, política, família – e a acolhedora mãe Eloá, Astolfo em Rogéria, Rogéria em Astolfo, e arte. Para quem quiser, é sempre bom (re)ver o premiado documentário de Leandra Leal, Divinas Divas, com uma outra (boa) dose de Rogéria. Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto, aliás, foi premiado no Festival DIGO, de Goiânia, e recebeu o prêmio Reconhecimento de Direção de Documentário no Festival de Cinema Brasileiro de Los Angeles.

Ficha Técnica

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