O Homem das Mil Caras

Hoje o espanhol Francisco “Paco” Paesa é um senhor de 84 anos, mas na década de 80 foi o agente secreto que fragilizou o grupo nacionalista ETA. O espião vendeu à organização terrorista dois mísseis com localizadores, que identificaram uma de suas centrais. O governo espanhol, porém, não reconheceu o feito e ainda decretou sua prisão. É bem verdade que Paco não era flor que se cheire e sua mais audaciosa falcatrua é narrada no thriller O Homem das Mil Caras, vencedor do Goya 2017 de ator revelação e roteiro adaptado - a partir do livro de Manuel Cerdán.

Falsificar identidades era uma das habilidades desse faz-tudo que se envolveu com gente graúda. Um deles, Luis Roldán (Carlos Santos), era ministro da Guarda Civil espanhola e no início dos anos 90 foi pego em um milionário esquema de corrupção. A missão de Paco era tirá-lo de cena e fazer o dinheiro “desaparecer”. Suas artimanhas driblaram os serviços de inteligência espanhóis por anos e ganharam o noticiário. Há imagens de telejornais da época que dão o tom até farsesco do jogo de gato e rato.

Quem conta a história é o piloto de avião Jesús Camoes (José Coronado), que se tornou parceiro de Paco pela grana, claro, mas principalmente pela aventura. Seu olhar é pitoresco e admirado, mas o diretor Alberto Rodríguez (do premiadíssimo Pecados Antigos, Longas Sombras) segue os passos amorais de Paco (Eduard Fernández, Todos Já Sabem) na adrenalina. Até nos entreatos o espectador fica grudado na tela, porque o protagonista é um golpista cirúrgico e tem uma vendeta pessoal contra o governo que o descartou.

Para o público brasileiro, O Homem das Mil Caras é de uma atualidade incômoda. Delações premiadas, arquivos vivos, arquivos apagados, criminoso escondido, dinheiro desviado, parentes envolvidos, corrupção enraizada, e por aí vai. Qualquer semelhança é mera coincidência, ou vai saber se as peripécias de Paco inspiraram alguns dos nossos bandidos de colarinho branco.

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