O Diabo de Cada Dia

O escritor Stephen King (Cemitério Maldito) e os Irmãos Coen (diretores de Fargo) parecem ter dado as mãos e criado juntos O Diabo de Cada Dia. O clima de suspense e o ambiente rural emolduram personagens obscuros, caipiras do centro-oeste americano que se enroscam em uma espiral de violência alimentada pelo fervor religioso. A influência é clara, mas a fonte da produção da Netflix é o best-seller de Donald Ray Pollock. O próprio autor assume o posto de narrador da adaptação comandada por Antonio Campos, um cineasta particularmente interessado em tramas macabras - ele dirigiu episódios da série The Sinner.  

Pollock cresceu em Knockemstiff, vilarejo no interior de Ohio que serve de cenário para esse circo de horror que começa em 1957, mas vai e vem no tempo para contar a história de Arvin Russell, interpretado na juventude por Tom Holland (Homem-Aranha: Longe de Casa). Primeiro conhecemos os pais dele, Willard (Bill Skarsgård, série Castle Rock) e Charlotte (Haley Bennett, Missão no Mar Vermelho), para então descobrir as trágicas circunstâncias que o tornaram órfão. Arvin é criado pela avó e cresce ao lado de Lenora (Eliza Scanlen, Adoráveis Mulheres), outra órfã que também perdeu os pais em eventos escabrosos, ambos envoltos no fanatismo religioso.

Nas encruzilhadas da vida, Arvin enfrenta um policial corrupto (Sebastian Stan, Eu, Tonya), um casal de serial killers (Jason Clarke, Cemitério Maldito, e Riley Keough, A Casa que Jack Construiu) e um pastor profano (Robert Pattinson, O Farol). O diretor arranca atuações magnéticas do elenco estelar e alinhava a trama com um MacGuffin original: um pistola alemã Luger, supostamente usada por Hitler para estourar os próprios miolos. Para quem não sabe, MacGuffin  é um termo popularizado por Alfred Hitchcock, e se refere a um dispositivo que impulsiona a narrativa.

A fé e a perdição estão em comunhão em O Diabo de Cada Dia. Arvin se vê imerso em um derramamento de sangue que, paradoxalmente, lhe abre caminho para fazer as pazes com sua tenebrosa infância. A religião está no epicentro dessa obra pessimista e indigesta, mas basta abrir os olhos para notar que Knockemstiff, chafurdada na hipocrisia e na amoralidade, é um microcosmo extensivamente representativo.

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