Sempre em Frente

Depois de vencer o Oscar pelo perturbador Coringa, Joaquin Phoenix aposta no afeto em Sempre em Frente. Mas não é pelo astro que o novo filme do diretor e roteirista Mike Mills (Mulheres do Século 20) tem chamado a atenção na temporada de prêmios. A sensação em cena é o britânico Woody Norman, ator mirim que está indicado ao Bafta, o Oscar inglês, de melhor coadjuvante. Com perfeito sotaque americano, ele é Jesse, sobrinho de Johnny, vivido por Phoenix. Espertíssimo, mas sem aquele estilo chatinho de criança prodígio, o menino desconcerta os adultos com observações e questões precisas.  

Além do fofucho de 9 anos, outras crianças têm voz em Sempre em Frente, porque Johnny é um jornalista de rádio em tour pelo país para ouvir quais são os sonhos, medos e expectativas do futuro da nação. A travessia geográfica é também pessoal, porque o protagonista precisa ir de Nova York a Los Angeles cuidar de Jesse a pedido da irmã, Vivi (Gaby Hoffmann), enquanto ela vai ao norte da Califórnia acudir o ex-marido, que tem distúrbios mentais. Serão vários os encontros entre almas desencontradas, mas é o florescer da relação entre tio e sobrinho que o cineasta transforma em uma pequena peça lírica e filosófica. Não espere ação, abrace uma certa melancolia e verá um dos filmes mais ternos deste ano.

Sem pressa, Jesse e Johnny procuram se adaptar um ao dia a dia do outro. Através da convivência e de alguns flashbacks, o diretor passa a desvendar o íntimo de cada um. Do homem solitário que se distanciou da irmã após a morte da mãe, que lamenta o fim do próprio casamento e que, pela primeira vez, deixar aflorar seu instinto paternal. E do garoto sensível e idiossincrático, obrigado a lidar com a distância da mãe, a fragilidade do pai e ainda a se entender como parte de um mundo em transformação. Sim, porque Johnny leva-o a tiracolo em alguns compromissos profissionais. As paradas em Detroit e New Orleans são especialmente significativas, pelo olhar sincero das crianças locais sobre a outrora capital do automóvel e o renascido berço do Blues, destruído pelo furacão Katrina em 2005.

O enredo trafega com harmonia entre o ficcional e o documental, embalado pela inebriante “Clair De Lune”, de Debussy, e lindamente fotografado em preto e branco. Em entrevista ao canal do YouTube FabTV, o precoce Woody tomou a palavra do diretor para explicar que as imagens em preto e prato não criam distrações visuais no ambiente, para que o foco recaia exclusivamente sobre os personagens. O garoto é uma graça e o elenco adulto está entregue à sua inteligência. Phoenix é sempre maravilhoso, aqui particularmente bonito, e Gaby é ótima como a típica “mãe polvo”. Mas Sempre em Frente não seria essa poesia de filme sem Mills e sua câmera a passear organicamente entre eles, com todo carinho.

Ficha Técnica

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