Os Rejeitados

Lembram do cultuado Clube dos Cinco, que em 1985 agrupou adolescentes em um sábado de detenção na biblioteca da escola? O diretor, John Hughes, fincou seu nome nos anais da sétima arte com um divertido painel de arquétipos dessa fase de hormônios pululantes. Pois Alexander Payne realiza um clássico instantâneo com um inusitado clubinho de três em Os Rejeitados, novamente em ambiente escolar, porém um encontro entre diferentes gerações. Já são 91 vitórias em 172 indicações e a temporada de prêmios está só no começo.

Vencedor do Globo de Ouro de Melhor Ator em Comédia ou Musical, Paul Giamatti reúne-se com o diretor vinte anos depois de Sideways – Entre Umas e Outras (2004), e encabeça a nova trupe de pessoas que penam para lidar consigo mesmas e com os outros. Payne adora tipos complicados e criou alguns inesquecíveis. Como o inquieto aposentado interpretado por Jack Nicholson em As Confissões de Schmidt (2002), a petulante candidata a presidente do grêmio vivida por Reese Witherspoon em Eleição (1999), e o empresário no olho de um furacão familiar em Os Descendentes (2011), que rendeu o Globo de Ouro a George Clooney.

No caso de Giamatti, sai o antissocial enófilo de Sideways e entra o rabugento professor de História Clássica de Os Rejeitados. Em comum, têm a afinidade desmedida com a bebida, o apreço pela literatura e o espírito depressivo. Mas o segundo, Paul Hunham, é ainda menos solar. Solitário, preso às tradições e rígido, é um caso de ódio unânime entre os alunos. E não só eles, porque os outros professores jogam em seu colo a missão de cuidar dos garotos que ficarão na escola no período das férias natalinas.

Uma situação inesperada faz com que permaneçam ali somente Paul e mais dois “rejeitados”. Premiada com o Globo de Ouro de coadjuvante, Da’Vine Joy Randolph faz a invocada chefe da cozinha Mary Lamb. A trinca se completa com Angus Tully (o estreante Dominic Sessa), aluno brilhante, mas encrenqueiro em classe e fora dela. Tempo e espaço são significativos. É 1970 e a Barton Academy, colégio interno para meninos da elite na região da Nova Inglaterra, fica perto de Boston.

A Guerra do Vietnã responde pelo olhar triste de Mary, em luto pelo filho morto em combate. Bolsista em Barton, foi recrutado obviamente por ser negro e pobre. O recado político é claro. Desgostos familiares explicam a insolência de Angus, que guarda um grave segredo. As idiossincrasias de Paul também têm suas raízes reveladas, e a mais surpreendente o coloca em um patamar quase heroico no poético desfecho. Isolados naquele cenário gelado e com pouca calefação, os três aos poucos baixam os escudos e se deixam envolver pelo calor humano.

A atmosfera teatral é quebrada por uma viagem de campo, marcada por reviravoltas que autenticam os personagens e enternecem o espectador. Com humor agridoce, Payne esculpe seus protagonistas. Faz um cinema artesanal, filmado em locação, sem artimanhas visuais. Claro que se apodera do que o cenário oferece, mas o ser humano é sua matéria-prima. Confortável em uma era anterior ao imediatismo, ele dá tempo para os ruídos na comunicação entrarem em sintonia. A conexão de almas em Os Rejeitados é transformadora, sólida, não vai derreter como o gelo ao fim da estação.

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