1982

Em 6 de junho de 1982, forças da defesa de Israel invadiram o sul do Líbano. Tinham o apoio de milícias locais e a missão de chegar até Beirute para conter ataques palestinos. O cineasta Oualid Mouaness tinha 10 anos de idade e estava na escola quando ouviu o som e viu a fumaça do primeiro bombardeio. Ele se recorda bem da movimentação de professores e funcionários tentando manter a calma e a normalidade das aulas, diante dos sinais de que algo terrível acabara de começar. Quarenta anos depois, Mouaness volta à antiga escola e transforma essas memórias no fabular 1982. Premiada em Cannes e Toronto, e indicada do Líbano ao Oscar de 2002, a produção está em cartaz nos cinemas.

Em passagem por São Paulo para o lançamento, o diretor libanês disse: “Meu primeiro longa é autobiográfico por ser baseado no meu último dia na escola naquele ano, e início de um período que mudou a minha vida e a de todos os libaneses”. O pequeno protagonista chama-se Wissam (Mohamad Dalli) e é sua a perspectiva estampada na tela. Sem muita noção do que anunciava o estrondo de bombas e a visão de blindados na rua e de caças pelos ares, o garoto está mais interessado em chamar a atenção da colega para quem escreveu uma carta anônima. 1982 conta essa e, por tabela, mais duas histórias de amor em tempos de guerra.

Wissam sabe que, além da timidez que o impede de abordar Joanna (Gia Madi), o amor entre eles tem outro empecilho. Ela é da Beirute Ocidental e ele da Oriental. Em 1980, a cidade foi dividida pela "linha verde" em dois setores: o oriental, habitado quase exclusivamente por cristãos, e o ocidental, com predomínio muçulmano. Ele não imagina que pelos corredores da escola outro romance enfrenta obstáculos. Interpretada pela aclamada atriz e cineasta Nadine Labaki (Cafarnaum), a professora Yasmine tem conversas rápidas com um professor. Em meio ao desespero de pais e mães para buscarem seus filhos, eles tomam consciência do quão absurdo é abrir mão do amor por questões de intolerância política e religiosa.

Mas o que Wissam gostaria mesmo é de estar na mesma fase do irmão mais velho, com o namoro a todo vapor. Seu olhar para a realidade em ebulição é o da inocência e da fantasia. O imaginário ganha vida com técnicas de animação que inserem no meio do conflito um gigante salvador: o herói robótico que Wissam desenha no papel. Jorge Takla, diretor teatral brasileiro que pela primeira vez é produtor executivo de uma obra cinematográfica, comentou: "O filme é de uma delicadeza imensa. Há uma tensão no ar, mas ela é sutil. A violência está nos preconceitos, nas histórias que separam pessoas que se amam.”  Tem toda razão.

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