Logo após ser exibida na TV Globo, a série Amor e Sorte estreou no streaming com suas quatro histórias de relações em tempo de pandemia. A ideia é de Jorge Furtado, que escreveu dois episódios, mas a realização é um autêntico coletivo criativo. Incansável roteirista e diretor gaúcho, Furtado dirigiu Fernanda Montenegro na série Doce de Mãe (2014), Fernanda Torres e Lázaro Ramos em Saneamento Básico – O Filme (2007), Emilio Dantas e, novamente, Fernanda Torres na série Todas as Mulheres do Mundo (2020), entre outras parcerias com o elenco de Amor e Sorte.

Na direção artística, Andrucha Waddington, que dirigiu “as duas Fernandas” em Casa de Areia (2005), fez parceria com Patricia Pedrosa, colega de Furtado na direção da série Todas as Mulheres do Mundo. Waddington é um dos diretores da série Sob Pressão, outra criação de Furtado, na qual atua Fernanda Torres. Seria exagero dizer que grande parte da equipe de Amor e Sorte estava praticamente em casa, mas o elenco principal estava, já que Furtado queria mesmo incorporar parte da vida doméstica dos atores na ficção.

No caso do primeiro e mais longo episódio, “Lúcia e Gilda”, produção e elenco estavam todos em casa. Fernanda Torres e Fernanda Montenegro gravaram no sítio em que estavam isoladas com a família. Quem dirigiu o episódio foi Andrucha Waddington, marido de Fernanda Torres, e a equipe técnica foi formada pelos filhos do casal, netos de Fernanda Montenegro. Trabalho em família para narrar a conturbada decisão de Lúcia de arrastar a mãe para o sítio no interior a fim de protegê-la do alto risco de contágio de seu cotidiano carioca, do qual ela não queria abrir mão.

Os demais episódios também foram gravados nas casas dos atores, por eles próprios, mas supervisionados à distância pela equipe de produção. Em “Linha de Raciocínio”, Lázaro Ramos e Taís Araújo, da série Mister Brau, outra criação de Furtado, interpretam um casal que entra em conflito por causa do panelaço e de seu sentido político, mas acabam tocando em outras diferenças que o isolamento intensificou. “Territórios” se apropria do lar do casal Emilio Dantas e Fabiula Nascimento. Francisco e Clara decidem se separar, mas ela tem sintomas de contaminação, e a viagem dele para um congresso é cancelada. Os dois acabam redescobrindo por que se apaixonaram numa longínqua quarta-feira de cinzas.

Caio Blat e Luisa Arraes são corroteiristas e protagonistas de “A Beleza Salvará o Mundo”, o último episódio situado no final de semana do anúncio da pandemia. Manoel e Teresa acabam de se conhecer e decidem se desligar do mundo para curtir o romance, mas a quarentena os obriga a continuar juntos. Aspirante a diretor, o engenheiro químico Manoel decide fazer um filme com Teresa, atriz em ascensão agora desempregada, enquanto descobre a vacina contra o coronavírus por acaso.

Com a participação especial de Johnny Massaro, Drica Moraes e Arlete Salles, e a belíssima trilha de canções de Gilberto Gil, Amor e Sorte quer disfarçar o amadorismo natural da sua concepção original com o apelo do acesso à intimidade dos atores globais. No entanto, a ficção se impõe, e é ela que deixa a desejar, graças aos roteiros irregulares, mesmo no simpático primeiro episódio e, sobretudo, no quarto e último, bastante equivocado. Talvez ainda seja prematuro brincar com a vacina e o fim da pandemia.

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