Tempo

Desde que o pequenino Haley Joel Osment disse baixinho “Eu vejo gente morta” para Bruce Willis em O Sexto Sentido, M. Night Shyamalan nunca deixou de surpreender. E lá se vão 22 anos e 10 longas até o novo Tempo. Shyamalan é uma máquina de criar histórias enigmáticas, nas quais gosta de fazer aparições à la Hitchcock e que quase sempre guardam uma revelação final. Com esses ingredientes, ergue parábolas, metáforas e fábulas sobre temas profundos, atemporais e universais.

Às vezes a receita atinge a perfeição. Assim foi com o incomum rito de passagem do garotinho paranormal, com o poder do controle pelo medo em A Vila, e com os muitos “eus” que temos dentro de nós em Fragmentado. Às vezes o resultado sai meio torto, caso da religiosidade em A Dama da Água e o apocalipse em O Fim dos Tempos. Tempo entra para a segunda categoria, e olha que a ideia original é excelente. Inspirado na graphic novel francesa Sandcastle (Castelo de Areia), de Pierre-Oscar Lévy e Frederick Peeters, o diretor subverte a expressão “tudo tem seu tempo” com uma trama que começa bem demais.

Gael García Bernal (Estás Me Matando Susana) e Vicky Krieps (O Último Vermeer) formam o casal em crise que leva os filhos para dias de verão em um resort. Ela comemora o preço do pacote descoberto na internet e todos ficam ainda mais surpresos com a recepção calorosa do gerente, que oferece um passeio exclusivo para uma praia isolada. Na van – Shyamalan faz o motorista – aparece também a família de Rufus Sewell (Meu Pai), com a mãe idosa, a esposa obcecada pela beleza e a filha pequena. Na linda praia deserta cercada por falésias, eles se deparam com um homem (Aaron Pierre) cujo nariz não para de sangrar. Em seguida chega um casal de meia-idade (Ken Leung e Nikki Amuka-Bird).

O tempo anda em ritmo diferente nesse lugar em que meia hora corresponde há um ano de vida. As mudanças mais notáveis são nas crianças, que se tornam adolescentes em um piscar de olhos, e na idosa. Agora eles precisam correr - melhor, voar - contra o tempo e achar uma forma de sair dali, porque o caminho por onde vieram os repele com uma força magnética. O cineasta domina a linguagem cinematográfica e sua câmera está sempre no lugar e nos ângulos certos. Também acerta com um elenco plural, com astros de diversas nacionalidades.

Tempo abre uma infinidade de portas narrativas e temáticas, mas Shyamalan passa apenas raspando por algumas delas. O paradoxo entre o amadurecimento mental x corporal dos personagens infantis, a obsessão pela juventude, a valorização de cada momento, as vantagens e os desafios do envelhecer, e a incapacidade de se controlar o tempo. Existe um motivo para esse grupo específico estar na praia, mas desta vez a revelação do mistério é simplista, pouco inspirada e tem muitas pontas soltas. Melhor seria se Shyamalan deixasse um ponto de interrogação e confiasse na imaginação do espectador.

Ficha Técnica

Assista Agora!