Onde Quer que Você Esteja

Sabe aquelas situações trágicas que você acha que nunca vai acontecer com você ou com sua família e amigos próximos? Os diretores e roteiristas Bel Bechara e Sandro Serpa abordam o desaparecimento de pessoas em Onde Quer que Você Esteja, homônimo do curta-metragem de carreira bem-sucedida em festivais, lançado em 2003, disponível no site Porta Curtas. Do curta, os diretores mantiveram a temática e os protagonistas Débora Duboc (A Comédia Divina) e Leonardo Medeiros (Kardec), mas aprofundaram as histórias paralelas e a caracterização dos personagens.

“Onde Quer que Você Esteja” é o nome do programa de uma rádio  de São Paulo, comandado pelo radialista Adroaldo (Dagoberto Feliz) e seu assistente Maurício (Aduardo Alcaide). Eles abrem o microfone para parentes de pessoas desaparecidas mandarem seus recados e pedirem ajuda para localizá-las. Ali eles formam uma pequena comunidade, um lugar de encontro de dores e de tristezas, mas também de esperança.

É na sala de espera do estúdio do programa onde se encontram Lúcia (Débora), cujo marido sumiu há oito meses, e Waldir (Medeiros), em busca da mulher desaparecida há 12 dias. Para lá também vão Roberto (Samuel de Assis), atrás da mãe de seu bebê, e o casal (Brenda Lígia e Rafael Maia) cujo filho está desaparecido. A pequena Karina (Luiza Mesquita) e sua mãe (Juliana Mesquita) estão à procura do pai da garota, e a solitária Zélia (Sabrina Greve) quer reencontrar a babá que cuidou dela quando criança. Já Ana Maria (Gilda Nomacce, Como Nossos Pais) quer saber da filha adolescente, que fugiu de casa outras vezes.

No entrelaçar dessas histórias, Bel Bechara e Sandro Serpa manufaturam uma tessitura de respeito, reconhecimento e apreço ao sofrimento dos seus personagens, condenados a seguir a vida na ausência contumaz, silenciosa de seus entes queridos, sem direito a luto ou sequer informações. O recurso de usar o programa de rádio como núcleo narrativo dá ritmo ao filme, que sofre com algumas restrições no âmbito da produção, mas as compensa consideravelmente com dedicadas performances do elenco.

É curioso observar como o amadurecimento de Débora e Medeiros como intérpretes, quase 15 anos depois de filmar o curta, leva a novos contornos para seus personagens e o relacionamento entre eles. O mesmo acontece com os próprios diretores e sua evolução no comando da produção, que ganha inclusive um alívio cômico mais evidente. Nem a melodiosa trilha sonora de André Abujamra e Eron Guarnieri força um registro excessivamente dramático, porque a história já o tem sobrando.

No Brasil, os dados estatísticos oficiais mais recentes, de 2018, por si só já são trágicos. De 2007 a 2016, houve mais de 693 mil boletins de ocorrência sobre desaparecimento de pessoas, uma média de 190 por dia. Só no Estado de São Paulo, foram 242 mil. São oito pessoas desaparecidas por hora em média, todo dia, sem nenhuma atenção especial ou especializada para a situação.

Ficha Técnica

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