Mamãe, Mamãe, Mamãe

A imagem granulada, o figurino e os cenários remetem aos anos 1980, mas a presença do celular denuncia o novo século. O tempo em suspensão. Passado, presente e futuro são um só na casa petrificada pela tragédia. No início de Mamãe, Mamãe, Mamãe, novidade em streaming exclusiva da plataforma Filmicca, a pequena Erín morre em um afogamento acidental na piscina. A férias de verão da família perdem subitamente sua luz. Esse é um universo de luto particularmente feminino.

A estreia na direção da argentina Sol Berruezo Pichon-Riviére é um pequeno experimento sensitivo. Cleo (Augustina Milstein), irmã de Erín, se vê desamparada, apesar do socorro chegar na forma da avó, da tia e das três primas. A dor tira sua mãe de órbita. Ninguém consegue verbalizar a perda. Mamãe, Mamãe, Mamãe recebeu a Menção Especial do Júri na Mostra Generation do Festival de Berlim. Em econômicos 65 minutos, a cineasta se debruça sobre o “se descobrir mulher” sob a égide da inocência.

A sombra do luto e da incerteza permeia esse ciclo de autoconhecimento, mas não impede que Cleo e as primas vivenciem e compartilhem o amadurecer. Uma delas dança sensualmente de olho no rapaz que vem ajudar a cercar a piscina, a outra treina o primeiro beijo em um tomate e Cleo menstrua primeira vez. A fecundidade se materializa no coelho branco que vira pet da turma. Também autora do roteiro, a diretora trabalha simbolismos de forma lúdica.

Até lobo mau tem vez naquele universo infantil. Uma garota paraguaia se agrega ao grupo, quebra a harmonia entre as primas com histórias de horror sobre homens que sequestram meninas, e instala o medo no já fragilizado ambiente. Com seus vinte e poucos anos, a jovem cineasta faz de Mamãe, Mamãe, Mamãe sua casa de bonecas. Ali brinca e observa o rito de passagem de suas personagens. É bem capaz que não se dê conta de que ela própria deixou aquela casinha há pouco tempo. 

Ficha Técnica

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