Duna

O diretor franco-canadense Denis Villeneuve era adolescente quando leu o best-seller de Frank Herbert, Duna, e se viu na pele do personagem Paul Atreides. O jovem de 15 anos é filho do Duque Leto e de Lady Jessica, e herdeiro do trono do planeta Caladan. Na trama ambientada em algum canto da galáxia no ano 10191, o duque atende ao chamado do Imperador Padishah para que assuma o controle de Arrakis, mais conhecido como Duna, o único planeta do universo onde existe a especiaria Mélange. A substância aumenta a expectativa de vida, seu uso prolongado deixa os olhos azulados e, mais importante, expande a percepção e permite que os navegadores tracem rotas estelares. Ou seja, sem a Mélange não há viagens espaciais, não há comércio.

Assumir a extração da Mélange significa ganhar dinheiro, daí a concessão de exploração ser tão disputada. Mas também significa colonizar o planeta originalmente habitado pelos Fremen. Agora subjugados, eles vivem isolados no inóspito deserto, na esperança de que a profecia da vinda do Messias que os libertará se concretize. Os Atreides são do bem, ao contrário dos antecessores, os violentos Harkonnen, liderados pelo Barão Vladimir, sujeito asqueroso que não quer largar o osso depois de 80 anos de domínio, e prepara um contra-ataque.

Essa narrativa aparentemente simples rendeu um romance com mais de 500 páginas, considerado um marco no gênero ficção científica e pedra fundamental de uma antologia com mais 5 volumes. Ao contexto político da guerra pelo poder, econômico da exploração comercial e humanista do colonialismo opressor, soma-se o fervor religioso. Lady Jessica é discípula da ordem Bene Gesserit, composta por mulheres com jeitão de feiticeiras e donas de poderes mentais sobrenaturais. Elas acreditam que Paul pode ser o Messias. Pois é nesse mundo complicado que se encontra o jovem protagonista, que não pode se bastar com os já numerosos desafios típicos da idade.

“Eu me vi naquele garoto curioso sobre uma nova cultura (dos Fremen), sonhando com um novo mundo (Duna) e pressionado a honrar as expectativas da família e do reino”, disse Villeneuve em entrevista ao apresentador Stephen Colbert. Duna é essencialmente um rito de passagem, uma história de adeus à inocência, mas em um mundo em que tudo ganha uma escala imensa. David Lynch foi o primeiro a adaptar o livro de 1963, mas o próprio cineasta renega a versão de 1984. Diz que Duna foi o maior fracasso de sua carreira. Houve também uma minissérie para a TV em 2000, mas nada se aproxima da grandiosidade da visão de Denis Villeneuve.

Duna é sua terceira ficção científica seguida, na esteira de A Chegada e Blade Runner 2049. Vale observar que a superprodução se desenvolve ao redor do drama familiar, um tema que lhe é caro desde Incêndios, indicado ao Oscar 2011 de Filme Internacional pelo Canadá, e que o colocou no radar de Hollywood. O apuro estético que também lhe é característico alcança o topo com a recriação do cenário oceânico de Caladan, em contraposto ao arenoso terreno de Duna. E o que dizer das naves que levantam voo como libélulas de aço, ou do visual pré-histórico dos vermes gigantes que habitam as profundezas do deserto. Magnífico.

Com Timothée Chalamet na pele de Paul Atreides, o elenco não é menos que fenomenal: Oscar Isaac (Duque Leto), Rebecca Ferguson (Lady Jessica), Stellan Skarsgård (Barão Harkonnen), além de Jason Momoa, Josh Brolin, Javier Bardem, Dave Bautista, Charlotte Rampling e Zendaya – esta última interpreta Chani, a Fremen que habita os sonhos premonitórios de Paul. A questão é que tudo é tão enorme quanto a preocupação em ser fiel ao romance original. Tanto que Villeneuve já anuncia na abertura: Parte 1. Para quem não conhece ou pouco sabe da história, a situação é frustrante. Porque a narrativa é lenta, por vezes entediante, com mais contemplação que ação. Quando finalmente os personagens tomam corpo – e alma – se passaram mais de duas horas e a trama se interrompe. A Parte 2 não está filmada e depende da bilheteria. A aprovação está em 88% no termômetro do Rotten Tomatoes, então a chance de continuação é real. Mas quem quiser se antecipar ao desfecho, assista ao Duna de 1984, disponível em streaming, que cobre (aos trancos) o livro todo.  

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