Democracia em Vertigem

Petra Costa (Elena, O Olmo e a Gaivota) é mineira, atriz, roteirista, cineasta de documentários. Sua mãe, Lian Andrade, é da família Andrade, do Grupo Andrade Gutierrez, uma das construtoras mais bem-sucedidas do País, suprassumo da elite brasileira. Lian e seu marido, pais de Petra, foram militantes de esquerda. Lian, inclusive, ficou presa no mesmo cárcere que a ex-presidente Dilma Rousseff, em momentos diferentes da ditadura. É esta diáspora social e cultural, cravada nas raízes da cineasta e do Brasil, desde 2013 até as últimas eleições presidenciais, que Petra Costa investiga no excelente e essencial Democracia em Vertigem.

São quase duas horas - que voam - de um impressionante conjunto de imagens, registros e entrevistas dos principais eventos e protagonistas da história política recente do Brasil, urdida e “encenada” em Brasília. Lula, Dilma Rousseff, Aécio Mendes, Jair Bolsonaro, Gilmar Mendes, Eduardo Cunha, Sérgio Moro, Gilberto Carvalho, representantes dos nossos tristes três poderes executivo, legislativo e judiciário, estão no foco da câmera em meio às investigações da Lava Jato e a prisão de Lula, às negociações parlamentares e o impeachment de Dilma Rousseff, às articulações que levaram à eleição do atual presidente Jair Bolsonaro.

Fatos, dados e versões, exclusivos, públicos ou ainda originários daquele que já foi chamado de quarto poder, a imprensa, ainda frescos na memória nacional, vão sendo apresentados pela narração de Petra Costa em primeira pessoa. Ser político por excelência, a narradora (re)vê a sua história pessoal no espelho retrovisor, embaçado, da ditatura; no reflexo, opaco, da abertura; nos estilhaços de luz da democracia conquistada a ferro, fogo, vidas e esperança. Em certos dias, em Brasília, a cineasta estava com sua câmera na mesma locação de Maria Augusta Ramos, nas filmagens de O Processo. Ambos seminais para a compreensão deste politicamente conturbado ano de 2019, os dois filmes registram processos contíguos, mas distintos.

Para somar às suas já ricas imagens e entrevistas, a diretora contou com material adicional fornecido por Ricardo Stuckert, o fotógrafo oficial de Lula, e o filme revela ângulos, planos e emoções inéditos. A montagem fluida, árdua, impecável, foi feita a 12 mãos e colaboração adicional. Mas é o fio condutor do documentário, tecido no extraordinário roteiro escrito por Petra e seis parceiros, na voz mineira, pausada e calma da cineasta, que desarma.

A narradora não esconde ou nega erros do processo democrático-“liberal” do País das duas últimas décadas que tingiram a esperança – ela de novo – de tons indesejados, mas também não esconde o suplício com a truculência desumana do discurso e das atitudes conservadoras, mais à direita, que ganhou as eleições de 2018. O filme tem viajado o mundo e recebido críticas positivas, calorosas. Na sua narração, no entanto, vislumbra-se um arrepio - de torpor, tristeza e desilusão.

Ficha Técnica

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