Caros Camaradas! Trabalhadores em Luta

Os eventos narrados em Caros Camaradas! Trabalhadores em Luta ocorreram em 1962, mas foram mantidos em segredo até a década de 90, quando foi iniciada a primeira investigação oficial. Indicado ao Bafta (Oscar inglês) de melhor filme estrangeiro e representante da Rússia no Oscar 2021, o novo filme do veterano Andrei Konchalovsky (Expresso para o Inferno) tem a mesma urgência, a mesma fotografia em preto e branco e a mesma protagonista que o premiado Paraíso, vencedor do Leão de Ouro de melhor direção em Veneza 2016.

Casada com o cineasta na vida real, Yuliya Vysotskaya interpreta Lyudmila, uma executiva do Partido e comunista devota, que tem Stalin como ídolo e brada com vontade seu nacionalismo. Mãe solteira da jovem Svetka (Yuliya Burova), ela mora com o pai idoso e é amante do patrão, o cabeça do comitê regional da pequena Novocherkassk, no sudoeste da então União Soviética. Entre os dias 1 e 2 de junho de 1962, os trabalhadores da fábrica local entraram em greve contra o aumento de preços dos alimentos e a redução dos salários.

Com o estilo naturalista que lhe é peculiar, Konchalovsky filma primeiro os bastidores do impasse, com Lyudmila e os membros do comitê encurralados pelos grevistas na fábrica. Depois instala-se tensão ainda maior, quando a população se aglomera na praça central à frente do pomposo palácio Ataman, sede do Partido Comunista na época. Até hoje não se sabe se o primeiro a abrir fogo contra os manifestantes foi o exército soviético ou a KGB, mas a tragédia que se seguiu, e entrou para a história como Revolta de Novocherkassk, afeta diretamente a protagonista.

Quando descobre que a filha estava na praça e desapareceu, Lyudmila empreende uma busca desesperada por informações, apesar do bloqueio da cidade, das prisões em massa e das tentativas das autoridades de encobrir o massacre. Esse processo doloroso dispara outro avassalador. Ao testemunhar o banho de sangue, Yuliya vê seus ideais políticos e sociais ruírem – uma consciência que se torna aguda durante um diálogo em que o pai a confronta com as contradições do regime que ela abraçava com ardor.

Caros Camaradas! Trabalhadores em Luta traz à luz um episódio negro da União Soviética do primeiro-ministro Nikita Kruschev. O diretor Konchalovsky deixa à céu aberto as feridas do passado de seu país e, sem declarar, faz uma ponte com o regime democrático de fachada do “czar moderno” Vladimir Putin.

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