Adolescência

Alerta! Não assista com sono ou cansado. O aviso pode soar estranho, mas não é sem razão. Adolescência foge do padrão no que diz respeito a sua narrativa e, em especial, em sua forma. Seus quatro episódios de cerca de 60 minutos foram filmados em um único plano-sequência. Ou seja, a câmera que abre o episódio é a mesma que irá fechar. Não há edição e isso dá um trabalho danado para todos os envolvidos. Do ponto de vista técnico, muitos acharão fantástico e outros podem considerar chato. Vencida essa possível barreira, a minissérie é um drama criminal com potencial para promover o debate sobre o mundo moderno, as relações humanas, pedagógicas e, não tem como fugir, políticas.

Em uma pequena cidade inglesa, a rotina de uma família é totalmente abalada quando a polícia invade a casa para prender um jovem de 13 anos, sob suspeita de ter assassinado uma colega da escola. Levado para interrogatório na delegacia, na companhia de seu pai, ele acaba detido e vai para um Centro de Treinamento de Segurança. Lá, ele é submetido a entrevistas com psicólogos, enquanto os investigadores procuram a arma do crime e a motivação. É quando surgem indícios de bullying escolar aliado ao ambiente virtual das subculturas masculinas de jovens, de alguma forma, frustrados sexualmente.

Apesar dos assuntos polêmicos, tudo é mostrado meio raso em Adolescence (no original). Se em dado momento aponta para a violência parental, no seguinte já vira para o bullying ou dá uma guinada para a internet e redes sociais. Assim, o absurdo caos nas relações entre dirigentes, professores e alunos parece uma frase escrita em giz. A injusta e dolorosa sensação de culpa dos pais é como mato no quintal. Até a questão da misoginia, cuja citação do real Andrew Tate (influencer cheio de acusações e processos) tira o filme da ficção e mostra um viés político, não evolui. A superficialidade do roteiro fica evidenciada — especialmente para os pais espectadores menos conectados — quando o policial começa a ligar os pontos com base em pistas vindas do “mundo real”. Emojis críticos, mensagens codificadas e menções a comunidades como os Incels (“celibatários involuntários”) e os RedPill, referência à famosa escolha de Neo em Matrix (1999), parecem jogadas na trama mais para soar atual do que para de fato aprofundar a narrativa. Precisamos falar sobre misoginia? Sim, mas precisamos falar sobre misandria também. Até porque estão interligados.

Criada, escrita, produzida e coprotagonizada por Stephen Graham, ator de obras pop como Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas e Snatch - Porcos e Diamantes, a série é comandada com pulso firme por Philip Barantini. É a segunda colaboração da dupla, que já havia sido aclamada pela série O Chef (2023). Não surpreende que Graham se destaque como o pai do aluno preso, interpretado pelo estreante e promissor Owen Cooper. As cenas de ambos, juntos ou não, transbordam emoção. A tensão que o enigmático Jamie impõe à psicóloga Briony (Erin Doherty) é um primor do medo. Da mesma forma que um filme não precisa, necessariamente, ser uma “aula”, é fato que Adolescência poderia amadurecer bastante o debate sobre temas urgentes à sociedade contemporânea. 

Ficha Técnica

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