A Trincheira Infinita

Parte fundamental da batalha contra a Covid-19, o isolamento social pode durar meses. Psicólogos e psicanalistas dão dicas para atenuar efeitos como ansiedade, angústia e outros transtornos que afetam a saúde mental. Pois então multiplique os meses por anos, melhor, décadas. Premiada produção espanhola da Netflix, A Trincheira Infinita se baseia em histórias reais de pessoas que permaneceram escondidas por mais de 30 anos atrás de falsas paredes e pisos, para escapar do fascismo.

A trama abre em 1936, início da Guerra Civil Espanhola, confronto entre socialistas e nacionalistas que fez mais de 500 mil vítimas. Em uma cidadela da Andaluzia, o recém-casado Higinio é delatado por um vizinho que o culpa pela morte do irmão. A caminho da prisão, ele escapa e é escondido pela esposa, Rosa, em um buraco secreto abaixo de uma prateleira da cozinha. A esperança de sair ao fim da guerra, em 1939, vai para o ralo com a ascensão de Francisco Franco e o início de uma ditadura que só chega ao fim em 1975, com a morte do general. Assim como no Brasil, a transição para a democracia foi marcada pela anistia a presos políticos.

O espanhol Antonio de la Torre viveu o ex-presidente uruguaio José Mujica em Uma Noite de 12 Anos, um retrato sem concessão dos anos de cárcere do político durante a ditadura daquele país. Na pele de Higinio, ele entrega outra atuação primorosa, agora preso dentro da própria casa. Belén Cuesta faz sua mulher, a costureira que abdica da própria liberdade para cuidar do marido. Desconhecidos por aqui, os diretores Aitor Arregi, Jon Garaño e Jose Mari Goenaga fazem um trabalho meticuloso para atravessar quase 40 anos.

Dos cenários e figurinos à maquiagem de envelhecimento, tudo em A Trincheira Infinita serve de amparo para o elenco. Com atuações sóbrias, e nem por isso menos tocantes, tanto o casal quanto os poucos que entram e saem da casa deixam o espectador vidrado na tela durante quase 2h30 de duração. A narrativa faz uma radiografia da relação entre Higino e Rosa nessas décadas marcadas por inúmeras transformações pessoais e sociais. Constante apenas é a presença ameaçadora do vizinho, determinado a achar o fugitivo. Acompanhar a longa jornada de Higino até a liberdade ajuda a colocar em nova perspectiva o dramático período de quarentena provocado pelo novo coronavírus. 

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