A Mãe

O diretor Cristiano Burlan escreveu Maria para Marcélia Cartaxo, e não realizaria o projeto sem tê-la como protagonista. Pois A Mãe chega aos cinemas após levar os Kikitos de melhor direção, atriz e desenho de som em Gramado, e ser o grande vencedor do Festival de Vitória, onde foi eleito o melhor filme pelos júris oficial, popular e da crítica, além de ganhar troféus de direção, atriz e fotografia. Maria nasce emblemática, a mãe de todas as mães cujos filhos desapareceram.

O desta Maria chama-se Valdo (Dunstin Farias). É o único rebento da vendedora ambulante que migrou do Nordeste para “sobreviver” no Jardim Romano, bairro da periferia paulista. Do pai do jovem, nem sinal. Valdo some em um dia como todos os outros, e Burlan segue os passos de Maria em um tour de force físico e emocional na busca por seu paradeiro. Marcélia se eternizou como a Macabéa de A Hora da Estrela, e por ela foi eleita melhor atriz no Festival de Berlim de 1986.

Há pouco atingiu novamente a perfeição como Pacarrete, premiada obra-prima de Allan Deberton. “Marcélia tem em seu rosto uma dimensão humana rara de encontrar”, diz Burlan em conversa com OQVER (veja vídeo a seguir). “Macabéa, Pacarrete e Maria são registros distintos que de alguma forma se completam na capacidade de exprimir os sentimentos que Marcélia tem como atriz e mulher nordestina.”

Coassinado pelo cineasta e Ana Carolina Marinho, o roteiro percorre os estágios de um processo em que luto e esperança se revezam sem aviso. “É um filme árduo e a própria dificuldade do trabalho respinga no temperamento da interpretação”, comenta Burlan, cujas tragédias pessoais embasam sua cinematografia de denúncia. O assassinato do irmão pela polícia em 2001 deu origem ao documentário Mataram Meu Irmão (2013), e o assassinato da mãe pelo namorado em 2017 tornou-se um grito contra a impunidade em Elegia de um Crime (2018).

Maria desconfia que policiais militares estejam envolvidos no sumiço de Valdo. Sua jornada investigativa esbarra não só na burocracia e no desrespeito com que é tratada em órgãos de segurança pública, mas no incômodo que sua movimentação provoca no líder do crime na comunidade. O desfecho é revelador. Burlan não poupa ninguém.

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