A inglesa Olivia Colman é fora de série. Em Pequenas Cartas Obscenas, a vencedora do Oscar por A Favorita consegue ser simpática, odiosa, sofredora, maquiavélica, empática, espirituosa, genial. Na história inspirada em fatos ocorridos na comunidade costeira de Littlehampton nos idos de 1920, ela interpreta Edith Swan, solteirona e devota cristã que passa a receber cartas com xingamentos e largo repertório de profanidades. Depois da 19ª missiva, e pressionada pelo controlador pai (Timothy Spall) e pela submissa mãe (Gemma Jones), ela decide não só prestar queixa na polícia como acusar a vizinha.
Entra em cena Rose Gooding, vivida pela ótima Jessie Buckley (As Loucuras de Rose), que aqui faz uma imigrante irlandesa, mãe solteira, festeira, desbocada e de pavio curto. Há pouco elas eram melhores amigas e o roteirista Jonny Sweet arma situações agridoces e divertidas para revelar como foram de um ponto ao outro, mais especificamente, ao tribunal. Rose se diz inocente e nós acreditamos nela, mas os incompetentes e machistas policiais locais não hesitam em prendê-la. A única que passa a investigar outros possíveis autores das cartas é a policial Gladys Moss (Anjana Vasan), que nota diferenças entre a caligrafia da ré e a dos bilhetes. Sim, essa é uma história de sororidade e emancipação feminina.
A linha temporal endossa o espírito de luta das mulheres pela igualdade que permeia a narrativa. O movimento sufragista na Inglaterra se intensificou a partir de 1897, mas o direito ao voto feminino no país só foi conquistado em 1918, no início para as mulheres com propriedade e, em 1928, para todas. Edith, Rose e Gladys são vítimas da misoginia. Edith vive sob o manto da opressão paterna, Rose é julgada por seu espírito libertário e Gladys é sabotada no trabalho. A investigação secreta que ela empreende para salvar Rose da prisão acaba por agregar um grupinho de mulheres da comunidade. As artimanhas que inventam para pegar o verdadeiro culpado no flagra rendem cenas de riso fácil.
Pequenas Cartas Obscenas é bem agradável, embora convencional. Parece antiquado para o público de hoje, mas deixa implícito o paralelo entre o mundo das cartas de papel e o das mensagens de Whatsapp. Também convida ao debate sobre as transformações sociais e os desafios enfrentados pelas mulheres. Daí a cena final ser tão emblemática. Sem muito spoiler, mas termina com o riso, na verdade a histérica gargalhada, de alguém que celebra a liberdade na situação mais contraditória possível.
Trailer
Ficha Técnica
Título: Pequenas Cartas Obscenas / Wicked Little Letters
Direção: Thea Sharrock
Duração: 100 minutos
País de Produção/Ano: Reino Unido, EUA, França, 2023
Elenco: Olivia Colman, Jessie Buckley, Timothy Spall, Anjana Vasan, Gemma Jones
Distribuição: Sony Pictures
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